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quarta-feira, 16 de dezembro de 2015

Haja Café

Comigo é tudo ou nada
não vire minha moeda
posso bater em retirada
se me sentir em simples queda

Pra escalar um monte
é preciso em pedras se apoiar
só mesmo se eu fosse monge
pra ser capaz de levitar

Mas de monge não tenho nada
sou pessoa ansiosa
se é pra alegria ser apenas esperada
hora ela se dilui em prosa

domingo, 13 de dezembro de 2015

Bambúrrio

Nessa cartada pela qual a razão me condena
já até ganhei um poema
não valeu a pena?
E as rimas descem mansas
correnteza de rio que não cansa
risada que não quer sumir
leva minha vontade de dormir
freada apenas pela angústia do há dias
que reduzem minhas águas a pífias
E nesse fluxo convulso
escrever virou questão de saúde
pra estabilizar o pulso
pra aliviar a asfixia da atitude
É como se eu produzisse cocaína no organismo
e deixasse de lado meu típico outonismo
E quero deixar Júpiter orbitar em mim
trazendo todo bambúrrio que ele tiver afim

quinta-feira, 10 de dezembro de 2015

Logo Menos

Sim, eu faço monumentos de pequenos tijolos
não deixe minhas palavras lhe saltarem os olhos
não deixe que te arranhem meus arranha-céus
mesmo que ainda presos em tela e papel

Gosto de rasgar o céu de onde o ar é rarefeito
de me deixar cair em feitiços, observar seus efeitos
Fora o voo , não conservo noção do porvir
Além da certa queda livre se o paraquedas não abrir

Troquei o filtro sépia por um mais saturado
Vivo, exuberante e esfomeado
Cheio de pressa tanta
De rouquidão e seca garganta

Fecho os olhos porque posso ver através deles
Os milímetros da vertigem que flui ao longo deles
Cá bêbada, dançante, gaguejando galanteios
Eis uma caixa com meu fôlego dentro, sem receios



segunda-feira, 21 de setembro de 2015

Areias de ampulheta


            Meu primeiro poema foi sobre o tempo e a vulnerabilidade humana. Como antes, não me sinto capaz de me delongar com rimas sobre o tema. Ele não se deixar alcançar, como se fosse aquela relação passado-presente, onde a partir do momento que tento falar do presente ele já virou passado. É mais volúvel que água, pois esta pelo menos se acha capaz de se empoçar nas curvas da mão. O tempo é como o vento, é capaz de mover coisas extremamente rígidas mas é inobservável em essência, incapturável e cruel em sua hegemonia. Ele sempre aparenta estar do outro lado do cabo de guerra, nos puxando pra longe dos nossos desejos. É culpado de dois terríveis males: a nostalgia e a ansiedade, pelas vezes que decide passar devagar ou depressa demais. 
            No seu momento de maior angústia, pode ter certeza que tudo estará em câmera lenta. Nesse momento, seus olhos crescerão. Você vai ver o mundo cristalino, em toda a sua fragilidade. Vai perceber que toda a violência e toda movimentação inquietante do nosso século é simplesmente uma fuga em massa de pessoas querendo deixar para trás suas sombras e vazios. Ninguém gosta do escuro. Até os filmes de terror estão cada vez mais iluminados e substituindo o suspense pela violência gratuita. Em resumo, o ser humano acha que se ele conseguir correr o bastante vai parar de doer. 
        Mas o tempo pode ser vencido? É uma grande contradição ver pessoas combatendo o tempo para não morrer sem perceber que vencer o tempo é morrer. O que é pior? Se mergulhar em angústia e viver em câmera lenta, percebendo que cada passo rápido e desejante é um erro ou viver na fantasia de que se pode vencer o tempo, sempre correndo e nunca olhando pra si mesmo? Há quem diga que vez ou outra o tempo se rende, vez ou outra nos deixa ter felicidade, mas logo a toma de volta. Vale a pena viver a mercê dele em troca desses momentos? Mesmo sabendo que cada um deles será uma fuga da morte que há em nós?
            Acho engraçado pessoas dizendo que o tempo cura. O que cura é parar de lutar contra ele. As pessoas aprendem com suas próprias pegadas e o tempo coincidentemente ta pisando ali junto conosco. Mas a grande questão é: ele não é responsável por nada. O ideal mesmo era ter ele como amigo, afinal ele vai estar ali contigo custe o que custar. Mas é complicado gostar de alguém que te joga na cara o tempo todo que você só vive mesmo é pra morrer. As pessoas querem viver pra sempre. São inimigas número um do fim sem se lembrar que todo começo pressupõe um fim e vice versa.
           O tempo é, basicamente, um amigo sábio que te machuca com sua sinceridade. Ele nos ajuda a ver de forma pequena e panorâmica tudo aquilo que é enorme e focal enquanto está sendo vivido. E tudo que eu quero agora é andar devagar e não considerar nada grande demais, ou feliz demais, ou possível demais. Eu quero a sinceridade e a poeticidade da angústia.



sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Lar, amargo lar

Azedei. Tinha parado com o costume de ser uma escriba ambulante anotando meus insights pelo menos duas vezes por dia. A escrita tinha perdido o encanto, porque eu já não precisava tanto dela. Eu tinha trocado o sublimar pelo investir libido. E por mais que não fosse um investimento lucrativo, a sublimação nunca foi suficiente também. Agora voltei me fragmentando no twitter e os caracteres me oferecidos parecem frequentemente insuficientes. E meu impulso é de agora aglutiná-los aqui. Meu blog olhou pra mim e disse: bem vinda de volta, não me esqueça da próxima vez.

segunda-feira, 13 de abril de 2015

Flor

Entre galhos e folhas a flor do mamão
Nenhuma flor à mão
Manchada de lodo, eis a rosa no chão
Nenhuma flor à mão
Tulipas amarelas nas estampas do blusão
Nenhuma flor à mão
Uma quadra de flores somada à pichação
Nenhuma flor à mão
Flores trocadas entre o casal da televisão
Nenhuma flor à mão
Chegada adiantada e de supetão
Nenhuma flor à mão
Mágoa leprosa num coração
Nenhuma flor à mão
Tempo desbotado sem duração
Nenhuma flor à mão
Flores molhadas na madeira e roupas cor de escuridão
Nenhuma flor à mão

segunda-feira, 5 de janeiro de 2015

Um pedaço do infinito # Parte 2

O que me prende não é coisa isolada
Mas junção de maravilhas
Cada canto de minh’alma encontrada
Como se pra ela achassem-se trilhas
É volta à infância entusiasmada
Com risada engasgada
E ponta de nariz ensaboada
Por mãos pequenas e levadas
É o despertar da intelectualidade
O prazer de aprender juntamente
Sobre universo e gente
E fazer do desconhecido uma saudade
É a permanência da doçura no enredo
O deixar-se desarmar por seu olhar reticente
Com infinitude na ponta dos dedos
E expressão de um viver transcendente
É a calmaria do vento
Que traz a brisa carinhosa
Enche o peito por um momento
E segue sua rotina em prosa

Ainda encontro em ti modos de ser
Que passam longe de me acometer
Os quais não irei completamente adotar
Mas são essenciais pra me complementar
De um lado um amor despreocupado
Do outro um desesperado
Comportamentos excessivamente simplificados
Ou demasiadamente complicados
E surgem nossas epopeias do balancear
Expandindo cada dia o significado de amar

O resultado de nossa soma
É uma não-matemática obra de arte
Beleza tal criada no entre
Que por si só não há em nenhuma das partes
Um alicerce de proteção incondicional
Uma segurança paradoxal
Onde cada uma pode ser aquilo que se é
E a outra vai estar de pé
Para amar a parceira como tal
E ainda florece uma esperança
Que poderia se chamar certeza
De levar até o fim da vida essa dança
Como uma criação da natureza

Mesmo nos dias mais lindos
Manhãs que acordam-me sozinha parecem imperdoáveis
Horas em vão indo e vindo
Que parecem desprovidas de verdade
Como um tempero indiano
Que dá um toque especial à comida
E em cuja ausência os gostos parecem engano
E aplicando para a vida
Ela se tornaria correnteza despropositada
Caso eu não mais pudesse dizer eu te amo.